Edneide estava acorrentada, não
dormia direito, comia muito e com seus 80 quilos, o vestido justo das noitadas “...
cada dia mais curto...” (usando descaradamente a frase da canção de Chico
(minha história). Edneide é trabalhadora doméstica. Mulata genuína, nasceu no
Morro da Mangueira no Rio de Janeiro veio para o nordeste morar na casa dos
padrinhos no interior de Pernambuco, estava dando trabalho demais aos pais. Com
seu sotaque dengoso e seu rebolado fez logo amizade e conseguiu emprego em
Recife numa casa de família tradicional. Acorrentada, este é o assunto. Apaixonou-se
por um homem casado, caso cheio de atropelos.
Ela já estava esgotada, a velha história,
não dava pra disputar com a madame, ele era um cara rico, bem sucedido , vida
feita, sociedade ,preconceito, era só sexo. Ela era bem “conhecida” da sua rapaziada,
mulher experiente, “negôna” que sabia jogar em todos os sentidos, mas agora
estava perdida, desaprendeu tudo, nem parecia aquela que no carnaval misturava
samba com frevo em pulos extraordinários, aquela que mentia para os ficantes e
no veraneio fazia sucesso nas rodas de samba dos nativos.
Não sabia o que fazer, a patroa
reclamava do excesso de sal na comida, dos soluços na hora de qualquer música
no rádio. Edneide resolveu pedir ajuda a um religioso. Andando no comércio
pegou um panfleto : “ Igreja Mundial da Paz do Corações Sofridos para Cristo e
para os Homens” Ed viu ali sua salvação.
Já no meio do palco, a igreja lotada, ela de
joelhos, e um homem com um livro imenso na mão gritava: “- Você está
acorrentada minha irmã!” E aos berros sacudia a cabeça de Ed pra frente e pra
trás e sua calcinha fio dental já incomodando sua minissaia subindo, e os fiéis
da ala masculina gritando: “Ô glória”! É o paraíso!”. Fim do descarrego. Ela
foi aplaudida como uma popstar que chega na cidade maravilhosa , material girl.
Estava salva daquele sentimento,
acreditou. Lembrou os conselhos do líder espiritual: “- ouça hinos, cante altos
os louvores, não esqueça” e também que havia esquecido de
pedir a Deus um iphone 5, de repente pagaria em 300x no carnê.
Dobrando a esquina, na feira, um vendedor
ambulante vendia o mais novo CD da dupla Bruno e Marrone , com antigos e novos
sucessos. Edneide não contou conversa, comprou.
O descarrego valeu para a igreja,
ela havia deixado metade do seu 13 º na sacolinha, a família já não aguentava
mais ouvir: “acorrentado em você” no som da Ed, agora “A Possuída”.
Yasmine Lemos
Direitos autorais reservados
lei 9.610 de 19/02/1998
Da blogueira: eu sou fã da dupla,
ouço muito suas músicas. A música me serviu apenas de inspiração, a música é
universal, amor é campo democrático e
livre,não fazendo divisão de classe, o amor é igualitário, jovem ,ridículo
,fraco e forte,brega e lindo,chique e cafona,rico e pobre,todos sofrem da mesma forma . YL
Bruno e Marrone :Acorrentado em você
Oi, Yasmine. Não deixe de me avisar via blog ou e-mail que tem post novo, esse é o lado ruim de fechar para blogueiros, as atualizações simplesmente não aparecem.
ResponderExcluirQuanto ao texto, maravilhoso. Não sou fão de música sertaneja (embora seja um tanto quanto passional), porém achei seu texto fantástico. O amor tem o poder de elevar ou derrubar a estima de uma mulher com a mesma facilidade...e dá-lhe cantar música alto junto com o rádio e lágrimas que não se acabam mais! Quem levou a melhor foi a plateia masculina da igreja, hahaha.
Um abraço!
Amiga seu texto é maravilhoso como sou fã de sertanejos a postagem esta completa.
ResponderExcluirUm lindo dia beijos no seu coração,Evanir.
Feliz recomeço.
ResponderExcluirMuito real a sua crônica. Adorei.
Nossa singularidade não há como ter plágio,somos únicos. As entrelinhas dos seus textos a confirmam.
Bjs
ResponderExcluirOlá querideza,
Texto adorável. Não pude deixar de imaginar a cena do descarrego na Igreja e me diverti com a manifestação da platéia: : “Ô glória”! É o paraíso!”. (rsrsrsrsrs).
Dor de amor é igual para todos.
Gosto das músicas do Bruno e Marrone.
Fiquei feliz ao vê-la publicar. Vi seu email esta madrugada. Vou respondê-lo hoje.
Ótimo dia.
Beijo.
Tu nos fizeste parecer ver na igreja tudo aquilo e a sensação de sair de lá com a sacolinha vazia, deixando o 13º... Muito legal tudo! beijos,chica
ResponderExcluirTotalmente demais, a Ed acorrentada e possuída.Cada cena me veio em meio ao sorriso que se estendeu do começo ao fim da leitura.
ResponderExcluirAmei, Yasmine!
Bjos,
Calu
Transitas bem por todos os dons Yasmine,
ResponderExcluirgostei do conto abessa_muito bom de ler,com cenas da nossa realidade e com um toque de ironia e humor ,Muito bom !
e também sou fã de musica sertaneja
meu abraço
Pense numa mulher acorrentada!
ResponderExcluirVi na Igreja o rico dinheirinho do 13º.
Melhor é seguir em frente.
Amiga, as suas atualizações do blog não atualizam. Por que será?
Xeros
Que texto massa!
ResponderExcluirViajei na vida da "negona"! Que delícia, deu vontade de ler mais! Quero mais dessa historia! Continuaaaaaa!
OLÁ MINHA QUERIDA !!!!!
ResponderExcluirFAZ UM TEMPO QUE PASSEI POR AQUI,POIS A ULTIMA QUE TENTEI NÃO DEU...AGORA VEJO QUE DEU,NEM ENTENDO ESSAS COISAS DE COMPUTADOR...
TEXTO CÔMICO E VERDADEIRO ...
BJSSSSSSSSSSSSSSSS
Muito bem Yasmine, ficou um show sua prosa com uma leve e sutil critica do social e relgioso.Personagens que estamos acostumados a ver pelo dia.
ResponderExcluirGostei da criatividade.Meus parabens amiga.
Um terno abraço de paz e luz.
Bjo.
Yasmine,
ResponderExcluirLindo conto. De uma forma sutil, você abordou assuntos que fazem parte da realidade da sociedade.
Feliz por saber que o blog está aberto novamente. Gostei do seu cuidado em enfatizar os direitos autorais.
Um lindo final de semana. Beijos
Yasmine,
ResponderExcluirQue conto incrível, adorei!
Eu lia e pensava na Flávia, uma diarista que eu tive aqui tempos atrás, assim mesmo, grandona, gostososa, cabelos enormes de apliques em trancinhas, ia embora toda produzida nos saltos. Era evangélica, dava tudo pra igreja e pegou até uma menina, filha de viciados em crack para criar. Mas, descobriu uma das traições do marido, a menina transava com o filho dela de 12 anos em casa, enquanto ela trabalhava nas casas de família, tudo dando errado em sua vida.
Soube agora, pela manicure, que ela largou a igreja, vai colocar silicone nos peitos e voltou pros bailes funks da comunidade.
Teu conto tem muito a ver com isto que também lhe conto, portanto a realidade é a mais pura nos dias vigentes. Flávia e Edineide, tantas por aí!
beijinhos cariocas