Tentei pedir que fosse embora, mas foi em vão. A sensação que estava ao meu lado conversava em forma de arrepios no corpo, e secura na garganta, entre eu e ela um espaço de segundos como se fosse uma estrada sem sinais para acostamento. Não havia placas para repouso.
O repouso dela era meu corpo, minha alma, embora a sentisse ao meu lado.
Conversamos em silêncio. Era uma noite igual, ela sabe muito mais sobre a minha vida. Conversei bobagens em tom menor, resmunguei queixas que apenas os meus pensamentos me ouviram. Tentei um diálogo. As respostas foram meus olhos queimando e o cheiro de lençol dobrado, intocável sobre a cama.
Agumas noites a mesma sensação se apodera do meu mundo e me toma os sentidos, como se eles fossem alheios. Vulnerável, eu deixo que ela me tome, arrancando cada soluço contido ou cada sorriso não dado.
Basta. Precisava relaxar o corpo na cama, esticar os braços e depois me encolher como uma concha. Mas essa companhia se tornou comum aos meus espaços, como um pássaro que voa e zomba da liberdade de poder adormecer e tomar conta do meu sono e conseqüentemente dos meus pesadelos.
Fecho as janelas na ilusão de tapar as entradas, mas existem as arestas, que por elas escapam os anseios mais ferinos.
Ela finge que voa, me esquece, e retorna quando preciso ser um pouco de mim, no corpo parado.
A reconheço em outros rostos insones, quando não estão sorrindo ou quando o olhar vagueia para o nada, sem condições de expressão maior, até em sorrisos abertos e alheios, como se a sensação forçasse a estupidez de uma cena patética, como uma noite sem medo.
Em muitas escuridões a insônia me faz companhia. Desisti de brigar com suas manhas, preferi torná-la uma companheira.
Ligo o rádio, a música é cansativa e sonolenta, mas não me contagia.
A xícara de leite na mão, a sala escura e um silêncio que dá vontade de gritar. Dentro do peito uma onda de cansaço. Percebo que parece com as ondas do leite que sopro para fazer lembrar o mar.
Dentro de mim ouço uma voz que pede sono e a outra grita:
-Fica. Tem um dia para nascer, você precisa assistir.
Retruco que são os meus dias de todas as antenoites, todas as madrugadas que não descubro a cortina do sol, por respeitar seu sono. Mas uma vez suplico:
- Insônia precisa ir, já fiz sala, lhe dei o meu cansaço e corpo, minha alma, não lhe dou, por mais que queira. Fica então com o meu lençol dobrado minha cama arrumada, afinal o mesmo dia já nasceu de novo.